Ran Rainha promete confronto com fundamentalistas e racistas caso seja eleita em Feira
Por Rafael Velame
Filha de mãe solteira, lavadeira, faxineira, defensora da causa LGBT, preta, produtora cultural, líder estudantil, estudante de cinema e ativista da soberania alimentar. Esse é um perfil de Helder Santos Souza, feirense, da Barroquinha, 35 anos, e que prefere ser chamado pelo nome de Ran Rainha e é pré-candidata a vereadora de Feira de Santana pelo PSOL.
Ran é bastante conhecida na cidade pelo ativismo cultural e por algumas polêmicas. No movimento estudantil desde os 15 anos de idade, foi uma das primeiras assessoras do mandato do então deputado estadual, Zé Neto. Na política, diz se espelhar na ex-senadora Heloisa Helena, no ex-presidente Lula, no ex-vereador Marialvo Barreto e no ex-deputado Jean Willys. “Essas pessoas me fizeram hoje o que sou enquanto pensamento na vida, me ajudaram muito a direcionar meu caminho”.
Ran conhece de perto os bastidores do legislativo feirense. Em 2005, trabalhou no mandato do professor Marialvo e diz ter visto muitos absurdos. “Muita coisa absurda tipo vereador marcando consulta”, conta. Essa prática ela não pretende adotar. “Coisas que não tenho intenção de fazer, tenho intenção é de denunciar”.
Por entender que a Câmara atual não representa o povo feirense, decidiu tentar ocupar uma cadeira no conservador legislativo feirense. “Decidi me candidatar pela ausência de representatividade política na Câmara, falta quem represente a juventude da periferia, a cultura de Feira, o debate de soberania alimentar e alguém que banque a pauta de políticas públicas LGBT”, reclama.
Como muitos moradores de Feira, Ran se sente um cidadã invisível na Câmara. “Ela não me enxerga. Não vejo atuação, não vejo resposta as necessidades da cidade. Cidade sem saneamento básico, sem pavimentação”, critica.
Ran Rainha foi responsável pelo Festival Elefante Branco, que usou as estações abandonadas do BRT nas avenidas Getulio Vargas e João Durval Carneiro para realização de uma “festa protesto”. “O festival teve o intuito de denunciar e dar visibilidade ao BRT usando o fator cultural musical para denúncias. Demos visibilidade a essa problemática da cidade”.
Sobre o BRT ela é taxativa.”Um BRT que não pensa na mobilidade urbana”.
Caso seja eleita, Ran promete debater políticas públicas pensando nas pessoas, algo que diz não existir na política atual da cidade. “Não tem contraponto, não tem oposição que paute os interesses do povo”. Para ela, a política esta em processo de desinteresse. “As pessoas estão desacreditadas que elas são capazes de ocupar esses espaços e por isso esse setor fundamentalista religioso ocupa esses espaço para destruir a gente”.
Desde que o PSOL tornou pública a sua pré-candidatura, muitas pessoas comentaram nas redes sociais que gostariam de ver um debate de Ran com o vereador fundamentalista religioso Edvaldo Lima no plenário feirense. “Edvaldo Lima só sabe atacar os LGBT. Ele só existe porque nós existimos. Temos que ocupar esses espaços para fazer contrapontos e para pautar a nossa realidade. Minha bandeira é por um parlamento com diversidade de pensamento”.
Um assunto recorrente nas redes sociais da pré-candidata é a soberania alimentar. Mas, o que é isso? Segundo ela, esse é um debate importante em Feira enquanto política pública. “Precisamos fomentar a criação de hortas orgânicas, hortas comunitárias na periferia. Em um momento desse de pandemia nossa independência alimentar seria muito importante”, explica.
Em 2011, aprovada no primeiro Enem da história, a feirense foi estudar História na cidade de Jaquarão, no Rio Grande do Sul. Mas, o sonho virou pesadelo. Ran virou notícia em todo Brasil por ter sido mais uma vítima da violência policial brasileira. Abordada pela polícia gaúcha com ofensas racistas e truculência, acabou agredida e presa. A estudante baiana denunciou as agressões à corregedoria da Brigada Militar gaúcha e acabou vítima de diversas ameaças de morte. Com medo, teve que retornar para Feira e foi temporariamente beneficiada pelo Programa de Proteção a Testemunhas da Secretaria da Justiça da Bahia. Por isso, a bandeira anti-racismo também será defendida. “Nosso mandato vai estar disponível a todos que forem vitimas de racismo. Não podemos passar pano pra racista. Se essa bicha preta chegar no mandato, nosso lema para racista vai ser bala e fogo”, brada. Caso consiga ser o primeiro homossexual assumido a assumir um mandato na Câmara de Feira, Ran Rainha entrará para história. “Quero construir políticas públicas não só para os LGBTS, mas para toda cidade. Ter um viado na Câmara, um representante de travesti na Câmara, essa será a primeira mudança”.
Algumas lendas pairam sobre Ran. Uma delas é a que vende brigadeiro de maconha nas festas. Ou como ela fez questão de frisar: “brizadeiro”. Os boatos surgiram porque ela faz parte da empresa “Manga Rosa”, culinária canábica. Eles trabalham com material importado e legalizado derivado da maconha. “Óleos, azeites, é diferente da maconha, são derivados do canabinol. Por exemplo, a semente da maconha é riquíssima em omega 3. Estamos desenvolvendo em Feira uma linha de produtos derivados desse material”, explica. Por fim, escolada com o processo de criminalização da maconha, Ran fez questão de deixar claro. “Não sou traficante. Não vendemos maconha. Todo material é importado que vem pelo correio”, ressalta.