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Política / 30 de dezembro de 2024 - 02h 58m

Exclusivo: Em fim do mandato, Jhonatas avalia derrota de Zé Neto, projeta futuro e diz o que espera do governo José Ronaldo

Exclusivo: Em fim do mandato, Jhonatas avalia derrota de Zé Neto, projeta futuro e diz o que espera do governo José Ronaldo
Foto: Divulgação
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Embora tenha sido o candidato mais votado da história de Feira de Santana, com 10.980 votos, o vereador Jhonatas Monteiro (PSOL) não conseguiu assegurar a sua permanência no legislativo, deixando a Câmara Municipal este ano.

Enquanto oposição, seu mandato teve como destaque a atuação nas lutas populares e a defesa dos interesses sociais. Professor da UEFS e Doutorando em História Econômica pela USP, Jhonatas conversou com exclusividade com o Blog do Velame, avaliando a legislatura, projetando 2026 e explicando como se dará a atuação, sem o mandato. Confira a seguir:

Blog do Velame: Apesar de ter sido o vereador mais votado da história de Feira de Santana, você não foi reeleito. Quem errou, o vereador Jhonatas por não procurar um partido que possibilitasse uma eleição mais viável ou você atribui a sua não reeleição a uma falha do sistema eleitoral brasileiro? 

Jhonatas Monteiro: Primeiro, considerando a minha trajetória, não tem muito cabimento a ideia de escolher partido por conveniência eleitoral. O que não faltam são figuras políticas que “pulam de galho em galho” porque, no final das contas, estão na disputa eleitoral por interesse pessoal e acham que vale tudo para chegar no cargo. Defendo um projeto coletivo e uma forma de fazer política que hoje têm mais identificação com o PSOL e, ganhando ou perdendo, é importante ter firmeza nas nossas convicções. Inclusive, isso exige paciência para evitar uma visão imediatista dos resultados eleitorais. Até porque a dificuldade de agora pode não estar colocada logo ali adiante, como é o caso de Salvador onde o Partido elegeu dois mandatos pela primeira veznestas eleições. Em segundo lugar, como disse em várias entrevistas, defendo a proporcionalidade no sistema eleitoral brasileiro porque permite melhor representação das várias correntes de opinião da sociedade, mas é evidente que são necessários ajustes para impedir distorções como vistas aqui e em outros lugares. No nosso caso, a questão não foi o coeficiente eleitoral como chegou a ser noticiado, até porque elegemos em 2020 sem atingi-lo isso e também era possível repetir isso agora. O principal problema foi o critério de 80% dele para que as candidaturas mais votadas acessem as chamadas vagas remanescentes ou “sobras” e, como algo bem diferente das eleições municipais passadas em Feira, o fato que alguns partidos políticos nessa faixa tiveram um número anormalmente alto de candidaturas com 20%, ficando na nossa frente na “fila” na ocupação de vagas na Câmara Municipal. A recente reforma eleitoral, até por ser conduzida por forças políticas conservadoras no Congresso Nacional, criou regras que dificultaram mais a vida de partidos de perfil como o do PSOL, mas não tenho dúvida que vamos enfrentar e superar isso nos próximos anos.

 Blog do Velame: Fazendo uma avaliação dos seus 4 anos de mandato, você acredita que sua atuação como oposição contribuiu para a melhoria da cidade? De que forma?

 Jhonatas Monteiro: É importante destacar que nesses quatro anos, com a participação decisiva do nosso mandato nesse processo, houve uma atuação mais ampla e organizada da oposição na Câmara Municipal. Isso tanto pela ação conjunta com os outros mandatos já eleitos como de oposição ou independentes quanto pela aproximação com outros vereadores que, em algum momento por essa ou aquela conveniência, chegaram a ter uma postura oposicionista. Essa força maior da oposição, comparada a outras legislaturas, muitas vezes precisou ser usada para um trabalho de “redução de danos” diante de um governo péssimo como foi o de Colbert Filho. Infelizmente, muito tempo e energia gasto com a cobrança para que a Prefeitura regularizasse pagamento atrasado de inúmeros segmentos ou retomasse obras paradas, por exemplo, ao invés de avançarmos na discussão e soluções de problemas estruturais do município, como saneamento ou transporte coletivo. Por outro lado, é inegável que essa atuação mais forte da oposição permitiu que projetos que em outros momentos seriam aprovados de qualquer jeito fossem mais debatidos e aperfeiçoados. Muitas vezes, a Prefeitura precisou responder e se adequar às questões colocadas por nós. Isso foi o caso, por exemplo, da necessidade de construção do Hospital Municipal, do perfil do Centro de Formação do SENAR no Parque de Exposições, da resolução do impasse para finalização do Centro de Convenções ou o detalhamento da finalidade no pedido de empréstimo para drenagem.

 Blog do Velame: A partir de 1º de janeiro de 2025, você deixa de ser vereador. Está nos planos mais uma candidatura a deputado?

 Jhonatas Monteiro: Inicialmente, tenho um compromisso profissional: preciso concluir um doutorado em andamento na Universidade de São Paulo (USP), o que ainda deve me ocupar muito durante a primeira metade de 2025. Vou conciliar isso com alguma atividade política no município e pelo estado, até porque têm lutas que não podem esperar, mas devo retomar o engajamento de modo mais forte na segunda metade do ano. No meio do caminho, tem muita discussão coletiva no PSOL e com os setores sociais que nos apoiam sobre as disputas eleitorais de 2026 e 2028. Até porque nem tenho como ignorar que a candidatura a deputado estadual já está, como se costuma dizer, “na boca do povo”. Para dizer o mínimo, a representação feirense na Assembleia Legislativa da Bahia é “problemática” e é natural que as pessoas busquem alternativas, o que muitas vezes aparece em relação ao meu nome pelo desempenho do nosso mandato na Câmara Municipal e o resultado eleitoral agora em 2024. Por isso, a tendência é sim uma candidatura a deputado estadual, mas ainda temos pela frente muito diálogo a fazer sobre o assunto.

 Blog do Velame: Na eleição, você apoiou a candidatura a prefeito de Zé Neto, o que você acredita que tenha faltado para uma vitória do grupo?

Jhonatas Monteiro: Às vésperas das eleições de 2024, Feira de Santana vivia uma situação limite: um governo municipal péssimo como continuidade do mesmo grupo político controlando a Prefeitura há mais de vinte anos. Pode ser que agora José Ronaldo não seja Colbert, mas todo mundo que acompanha o mínimo a política do município sabe que no mais central o governo de Colbert era de José Ronaldo. Costumo dizer que é uma soma de descaso com o povo, incompetência administrativa, corrupção e autoritarismo. Pior ainda, escararam a aliança com a extrema-direita. Diante de um quadro como esse, depois de muita discussão interna, o PSOL apoiou pela primeira vez outra candidatura no 1º turno. Mesmo com as nossas diferenças com o PT, o nome de Zé Neto era o que aparecia melhor posicionado e, até como aprendizado político, foi importante para as forças de oposição testarem a tática de unidade contra o grupo que controla o governo municipal. Inclusive, é uma experiência que ainda carece de um balanço por parte das forças políticas que estiveram envolvidas. Como contribuição ao debate, destaco três pontos ligados ao fato da candidatura de Zé Neto ter sido novamente derrotada. Primeiro, o envolvimento do presidente Lula muito aquém do necessário em uma disputa que terá repercussões logo ali em 2026. Em segundo lugar, a presença do governador no processo não pode ser o uso pontual da “máquina” na campanha ou aparições e promessas no ano eleitoral, mas atenção e investimento constantes antes do contexto das eleições – Como é o esperado para a importância dosegundo maior município da Bahia. Como terceiro ponto, considerando o nível de rejeição, a candidatura de Zé Neto deveria ser comunicada menos como dele e mais como de várias figuras que se uniram para dar um basta no retrocesso do município. Como algo que também influenciou o resultado vale lembrar ainda que, infelizmente, a Justiça Eleitoral foi tímida diante do uso do dinheiro e negociação daquilo que é direito como se fosse favor nas eleições.

Blog do Velame: O que esperar do quinto mandato de José Ronaldo a frente da Prefeitura de Feira?

 Jhonatas Monteiro: Como cidadão feirense, no mínimo, espero que cumpra as promessas de campanha e torço para que reflita sobre os problemas decorrentes de seus governos anteriores. O modelo de expansão urbana desenfreada, fortemente estimulado nas gestões de José Ronaldo, trouxe graves problemas para a qualidade de vida da população. A cidade cresceu, mas com enorme precariedade na oferta básica de infraestrutura e serviços públicos. Com aval do grupo político, o setor imobiliário comandou esse crescimento como quis e isso tem um preço alto para o povo na falta d’água, na inexistência de saneamento, no transporte coletivo que não dá conta, na ausência de creche etc. Mesmo as áreas de classe média, como diversos condomínios, são afetadas por isso como nos problemas de trânsito e nos recentes alagamentos. Na zona rural, em muitos distritos, a situação é dramática com os incontáveis loteamentos “clandestinos”. Além disso, é município feio pela falta de cuidado do Poder Público: pouquíssimos parques públicos e áreas verdes, patrimônio histórico abandonado, lagoas largadas àprópria sorte, vida cultural desvalorizada etc. Por sua vez, a resolução de “gargalos” antigos como o péssimo transporte coletivo e a limpeza pública ineficiente esbarra no arranjo de interesses entre as empresas que operam esses serviços e o grupo político na Prefeitura. Infelizmente, inclusive tendo em vista o recente anúncio dos nomes dosecretariado, a tendência é mais do mesmo. Aliás, é comum conversar com servidores públicos de carreira da Prefeitura e ouvir sobre a falta de abertura para ideias novas e para mudança nas práticas de gestão nos vários órgãos municipais. Então, corremos o risco de mais quatro anos em que tudo aquilo que é próprio de Feira e tem grande potencial, como as lagoas e as feiras livres, continue sendo negligenciado. Na prática, como depois dos governos de Clailton Mascarenhas e de TarcízioPimenta, o mais provável é o prefeito José Ronaldo seguir a mesma receita: aparecer como “salvador” fazendo o “feijão com arroz”, regularizando certos serviços públicos, e buscar deixar uma marca com “grande obra” de relevância social duvidosa.

 Blog do Velame: O que a população deveria saber sobre a gestão atual e a Câmara de Feira que muitas vezes não é divulgado?

Jhonatas Monteiro: Sem dúvida, chama a atenção o tamanho do problema que temos com o orçamento do município. Não só o modelo de elaboração é tecnicamente antiquado como deliberadamente vago, o que tornar a fiscalização muito difícil. Pior ainda foi descobrir que sistematicamente, como prática anterior ao próprio governo de Colbert Filho, a Câmara Municipal votava o orçamento e junto uma autorização automática de remanejo, suplementação, de 80% da previsão orçamentária. Além de ser um atestado de incompetência do planejamento do município, é um absurdo que o Poder Legislativo dê um “cheque em branco” desse tipo porque torna quase impossível acompanhar a execução do orçamento ao longo do ano. Na prática, é aprovada uma Lei Orçamentária Anual e, se quiser, o prefeito pode desrespeitar quase tudo que estiver programado para fazer ao longo do ano. Provavelmente, é uma das explicações para as obras paradas, serviços interrompidos e outras falhas da Prefeitura no atendimento à população.Depois de muitos embates ao longo desses últimos anos, especialmente com o nosso mandato, para 2025 o governo municipal reduziu o pedido para60%, mas continua sendo uma margem altíssima se comparado com municípios como Salvador. É importante lembrar que o orçamento feirense, previsto para o próximo ano, é de cerca de 2,2 bilhões de reais. Infelizmente, é um assunto que mobiliza poucos vereadores e mesmo os veículos de comunicação pouco abordam com a profundidade devida. Como consequência, a maioria da população vê o assunto como distante quando é contrário: se as ações do governo não estiverem previstas no orçamento são apenas propaganda enganosa e não vão acontecer.

 Blog do Velame: Que mensagem você gostaria de deixar para a população sobre a importância do papel da oposição na política local?

 Jhonatas Monteiro: É comum governistas adotarem o discurso que o papel da oposição seria “atrapalhar”, como se o sentido fosse ser contra tudo o que vem do governo de ocasião. É uma visão simplista e mesmo tosca, até porque não existe uma única forma de oposição. Do ponto de vista que defendo, a oposição precisa ter como critério a defesa do interesse público, das necessidades sociais e das lutas populares. É com base nisso que sempre busquei me posicionar diante de um proposta, o que implicou em apoiar projetos do Poder Executivo algumas vezes e ser contrário em outras. Com essa postura, conseguimos debater e melhorar certos projetos ou, ao menos, garantir que o cenário fosse menos pior do seria sem uma crítica da oposição. Sem dúvida, quem ganha com a existência de um contraponto qualificado desse tipo é a maioria da sociedade.


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